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O Quarto

Logo começa o primeiro problema da noite, o ar condicionado não funciona, e eu continuo a arder de calor. Mais de 40 graus. Eu não reclamo, pois quem sou eu para tal.


Procuro esquecer daquilo e relaxar (ou uma tentativa de relaxamento), ligo a TV e tento assistir ao jornal da madrugada. Faço isso durante cinco minutos, pois um pequeno "click", anuncia que a TV está desligada. Aí já começo a ficar um pouco desconfiado. Tudo bem que eu não esteja pagando, mas foram eles que sugeriram que eu passasse à noite por aqui, já que hoje saí às 22 e amanhã entro às 06. Depois da frustrante terceira tentativa em ligar a TV, ligo irritado na recepção:


--Niko, o que você está fazendo? -- Pergunto eu.


--Não sei do que você está falando, Pete -- Responde após um longo bocejo.


--Não vem com essa! Um de vocês está mexendo na TV.


--Como faríamos isso, Pete?


--Não seria a primeira vez. Fizeram isso por aplicativo de celular, com uma mulher!


--Pete, ela estava no primeiro andar. Você está no oitavo! O aplicativo não pega.


--Um de vocês deve estar no corredor!


--Duvido muito -- Diz ele -- Deve ser problema com o cabo.


Desliga na minha cara.


Esse idiota deve estar mentindo. Em todo o caso, melhor dormir, ou não trabalho amanhã. O problema é esse calor e esse cheiro estranho que tem no quarto. Decido então tomar um drink. Uma dessas garrafas de champanhe que temos no frigobar. Abro e tomo no gargalo. Cuspo tudo! Aaaaahr. Sirvo a bebida em um copo. Aquilo não é champanhe.


--Seus putos! Vocês passaram dos limites! -- grito ao telefone -- Quem foi o filho da puta que botou mijo no lugar da bebida?


--Mijo? -- Protesta Niko -- Primeiro, que você não deveria estar bebendo isso, Pete. Isso é para os hóspedes. Segundo, ninguém jamais faria isso!


--Vocês já enfiaram merda de cachorro, no sapato do Loyd!


--Mas isso foi entre os caras! Você não acha que faríamos isso com um hóspede, acha? A bebida deve estar estragada.


Desligo. Escovo meus dentes frenéticamente. Já chega! Vou dormir que ganho mais. Não suporto esse calor. Quem sabe dormindo essas horas passam mais rápido. Tranco minha porta, pela corrente de dentro. Vai que esses putos decidem me atormentar aqui. Apago tudo e vou deitar.


Durante a noite, o calor me faz querer arrancar o lençol, mas antes que eu faça isso, alguma coisa o puxa por mim. Fico assustado.


Procuro, mas é impossível que alguém tenha entrado nesse quarto sem que eu tenha visto.


Vou lutando contra o sono. Não vou até a recepção, senão aqueles otários irão me infernizar. O cansaço me vence e eu durmo. Um sono terrível, cheio de pesadelos e com muito calor.


Um pouco antes de amanhecer, é que o mais estranho - e o problema principal da noite - acontece: Uma sensação refrescante e babada (como uma lambida de cachorro, depois que ele toma água gelada), em uma de minhas mãos, faz com que eu vá acordando. O cheiro, é insuportável, como o cheiro de um animal morto. Fico arrepiado, ao despertar. Alguém, ou alguma coisa está lambendo minha mão.


Não penso muito, apenas pulo da cama, e corro até a recepção, pois, pra piorar, tive a sensação de ter visto alguém se esconder por trás de uma cortina - tenho certeza de ter visto uma mão horrenda!


Niko e os rapazes do bar estão no hall do hotel, rindo de mim:


--Não acredito que você desceu aqui de pijama!


--Niko! Niko! -- estou chocado -- O que era aquilo?


--Calma, cara! Fomos nós. Usamos o aplicativo, e colocamos o xixi do Totó hahahaha - sei que pegamos pesado - mas quando um de nós ia ter a oportunidade? Não dormimos sempre aqui! Cara, você tomou o mijo do Totó, hahaha!


--Como é que vocês entraram por último no quarto? -- Digo eu esbaforido.


--Tá maluco? Ninguém entrou no seu quarto.


--Niko! -- Digo irritado.


--Cara, nos desculpe, está bem? Isso é o medo falando mais alto. Você sempre teve medo dessas merdas de assombrações, mas não tem nada não!


Finjo sorrir com os caras e digo que está tudo bem. Mas discretamente, pego em minha mão. Ainda está lambida e cheirando a morte. Finalmente o dia raiou. Volto ao quarto, para pegar minhas coisas. A marca suada da mão, ainda está na cortina. A verdade é que eu nunca saberei. que criatura era àquela que dividia o quarto comigo. Uma coisa é certa. Era algo infernal, prova disso era que agora o ar condicionado funcionava, perfeitamente.

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